sexta-feira, 27 de novembro de 2015

REFLEXÃO SOBRE LINGUAGEM MATERNA E LINGUAGEM MATEMÁTICA

A propósito da Matemática é comum ouvirmos termos e expressões como as que se seguem: "a matemática é uma linguagem abstracta", "a linguagem da matemática é de difícil compreensão aos alunos", "a linguagem da matemática é precisa e rigorosa". Sendo a matemática uma área do saber de enorme riqueza, é natural que seja pródiga em inúmeras facetas; uma delas é, precisamente, ser possuidora de uma linguagem própria, que em alguns casos e em certos momentos históricos se confundiu com a própria matemática. Na realidade, esta linguagem é um meio de comunicação possuidor de um código próprio, com uma gramática e que é utilizado por uma certa comunidade. Esta linguagem tem registos orais e escritos e, como qualquer linguagem, apresenta diversos níveis de elaboração, consoante a competência dos interlocutores: a linguagem matemática utilizada pelos "matemáticos profissionais", por traduzir ideias de alto nível, é mais exigente do que a linguagem utilizada para traduzir ideias numa aula ou em uma convers informal. Da mesma forma, a linguagem natural assume registos de complexidade diferente dependendo da competência dos falantes. A comparação que se faz entre a linguagem  materna (natural) e a linguagem da Matemática,  apresenta diferenças marcantes. Desde logo, porque a linguagem matemática não se aprende a falar em casa, desde tenra idade – aprende-se, isso sim, a utilizar na escola. A aprendizagem da matemática apresenta, também, diferenças quando comparada com a aprendizagem de uma segunda língua natural – que habitualmente também ocorre numa escola – pois não encontramos, no dia-a-dia, um grupo de falantes que a utilize, em exclusividade, para comunicar. A linguagem da matemática carece pois do complemento de uma linguagem materna.
Na verdade, a linguagem matemática dispõe de um conjunto de símbolos próprios, codificados, e que se relacionam segundo determinadas regras, que supostamente são comuns a uma certa comunidade e que as utiliza para comunicar. Porque os falantes são dotados da capacidade de falar, a linguagem da matemática dispõe de um registro oral e, assim, podemos falar de uma linguagem matemática oral. Esta linguagem utiliza a língua natural como língua suporte. Embora com diferenças, a linguagem escrita da matemática tem um caráter mais universal do que a linguagem oral.
As práticas dos professores têm uma forte componente de linguagem. Estas práticas estão muitas vezes embebidas das visões e dos valores dos professores, de entre outras, sobre o lugar da linguagem e da comunicação no ensino e na aprendizagem da matemática. A linguagem da aula de matemática, além das concepções dos professores, é influenciada por outros fatores, como sejam as aprendizagens anteriores dos alunos, o nível sócio-cultural e a formação de professores.Daí a qualidade do trabalho desenvolvido por uma turma, e consequentemente o tipo de linguagem e a qualidade da comunicação, depende, em grande medida, da forma como o professor organiza as situações de ensino/aprendizagem, da forma como organiza o trabalho dos alunos, de como os orienta e das tarefas que apresenta (linguagem).Cabe ao professor encontrar tarefas que sejam equilibradas para cada tipo de alunos, ou seja, que sejam abordáveis por estes mas, ao mesmo tempo, desafiantes. As tarefas rotineiras, vulgarmente designadas por exercícios, não são, normalmente, geradoras de grande discussão entre os alunos, uma vez que o modo de resolução assenta num algoritmo já conhecido destes. As tarefas demasiado difíceis para os alunos  sem nenhum tipo de familiaridade  são, no outro oposto, inibidoras do desencadear da comunicação, que na maior parte dos casos bloqueiam totalmente.
É necessário que o professor escute os alunos e lhes peça para explicitarem o seu pensamento, pois se querem ajudar os alunos a valorizarem a Matemática, de forma a tirarem partido do seu poder, é fundamental mudarem as suas práticas, dando tempo para os alunos explorarem, formularem problemas, desenvolverem estratégias, fazerem conjecturas, raciocinando sobre a validade dessas conjecturas, discutirem, argumentarem, preverem e colocarem questões. Esta nova visão da comunicação na sala de aula, pressupõe um outro tipo de discurso. O professor, como principal responsável pela organização do discurso da aula, tem aí um outro papel, colocando questões, proporcionando situações que favoreçam a ligação da Matemática à realidade, estimulando a discussão e a partilha de ideias.



Débora Cristina Virgilino Cruz

Novembro/2015